domingo, 2 de janeiro de 2011

Não escutei quando criança "é hora de dormir". Sempre tive a minha hora. Nasci tendo a minha hora. Minha mãe saiu por aí, não me mostrou a hora dela, o momento dela. Meu primeiro contato com o mundo não foi compartilhado. Não foram duas vidas que viviam um momento. Foram duas vidas, dois momentos distintos. Nasci já em outras mãos. Outras mãos que pouco eram disponíveis a mim. Nasci em outras mãos e com o tempo essas mãos já não tinham mais tempo pra me segurar, pois outros precisavam dela. Nasci em outras mãos e em pouco tempo tive de tornar as minhas fortes o suficiente pra segurar a mim mesma. Nunca ninguém me mostrou hora alguma. Via o relógio da maneira que bem entendia. Se quisesse ver um tempo que passasse mais lento, podia. Se quisesse um tempo que voasse, podia também. Mas não. Vi um relógio com o tempo de se viver, o tempo suficiente de sobreviver a cada dia. E, vendo assim, cresci antes da hora. Soube determinar momentos certos, atitudes corretas, laços indispensáveis, tudo antes da hora. Consegui ver um caminho, um encanto, uma luz, tudo antes da hora. Tudo antes da hora deles. Me deram olhos só meus e uma vida. Fiz dela minha. Ninguém nunca me disse a hora de parar, a hora de seguir. Não parei na hora certa, não segui quando devia, várias vezes. Mas podia ser assim, porque era sozinha, ainda criava meu tempo. Aliás, ainda crio. E, ainda penso, quando me deparo com vidas cheias de horas, regras, certos ou errados, como a minha seria diferente. Como os gostos seriam diferentes... os prazeres, os encantos. Provavelmente nesse exato momento, palavra alguma existiria nesse papel. Provavelmente a voz ao fundo não seria de quem canta, e a hora que diz ser madrugada não diria nada. Mas, tudo é o que há, pois um dia nessa vida houve silêncio. E, palavras dizem hoje, porque ontem calaram... E, sou hoje, enfim, porque ontem não foram.
R.A 31/12/10

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