sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Pra sempre teu, Caio F.


Meu querido!
Que aperto no peito...
Coloquei uma música, apaguei a luz, e agora respiro fundo pra não chorar...
O que fizeste comigo?
Choro por ti!
Tá vendo todos esses textos aqui?
Foi um lado de mim que se entregou! Se entregou à sensibilidade.
Não sei onde estás, o que fazes, se a dor passou...
Mas sei de mim!
Não me deixam viver muito com o vazio... com te deixaram, como te deixaste.
Mas carrego ainda, no fundo do fundo de qualquer lugar que seja aqui dentro, o "essencial e verdadeiro".
Me ensinaste- numa presença de alma em alma- a não ter medo de assustar, de se assustar- de se deixar assustar.
Tu sempre me doeu muito... em toda palavra! E acho que porque me deparava com o que quase acabei sendo- meio morte e meio vida.
Nunca, numa carta, travei em todas as linhas. Eis aqui a primeira!
Tuas frases estão em cada pedaço meu. E, às vezes, acobertando os pedaços que não mostro.
Me conhecem muito já por ti! E onde tu estás?
Hoje muito sei falar de ternura por ti. Muito sei falar de dor por ti. Muito sei falar de mim por ti.
Queria ter olhado nos teus olhos uma vez só- e lamento por isso- por não poder ter feito.
Sinto algo forte na tua criação. Te sinto muito. Me sinto muito.
E... que agradecimento teria?
Nunca sei dizer por que tantas oposições carrego. Olho pra tua imagem- entendo.
Olho pra tua imagem- vejo as tuas tentativas desesperadas de vida- que se foram- e entendo.
Me achei no mundo, Caio! Mas continuo a perdida da mesma perdição que te fez.
Obrigada pela companhia. Por todo compartilhamento. Só isso que posso dizer!
E que estejas descansando em paz, ou na inexistência que tanto te fez.
Pra sempre tua,
R.A
25/02/11 (15 anos da morte de Caio Fernando Abreu)

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Feliz aniversário, Fer!


O que te dizer? Tem tanto!

Sabe... quanto começo a escrever uma carta pra alguém, eu escrevo sem compromisso. Acho que é uma das únicas coisas que faço assim, confesso. E faço assim, porque sei, não vou conseguir expressar nem metade do sentimento. Então simplesmente escrevo... que saia o melhor de mim.
Fer, quem é tu? Te vejo há dezesseis anos. Te vi diferente todo dia, desde os dias lembrados por mim. Muito vi, muito desejei saber o que era. Muito me confundiste, muito me deste nos nervos, muito me fizeste admirar. Muito, muito, muito- isso que te vejo. E isso que sinto por ti.

Sei que não gosta do sentimentalismo- mas deixa eu dizer que te amo uma vez só?

Acho engraçado como sempre tu me perguntas "foi a Ana?". (risos)

Fico indignada que tu sempre me pega nessa!

Por que tu não me pergunta "quem foi" quando leio encantada o Caio, quando escuto o Chico?

Queria também dizer "foi tu". Queria também poder dizer que muito me criei sentada na tua cama, te escutando, escutando "eu te amo" na voz do Chico, escutando de ti umas ou outras palavras do Caio. Fer- muito sou de ti. Talvez o que tu não seja mais, o que não quiseste sustentar ou não pudeste. Mas muito sou!

A tua ida foi um choque, não tem como dizer que não. Mas acho, também, que contribuiu mais do que qualquer coisa para o carinho que tenho por ti. Acho que nós duas sabemos bem disso!

Nunca fomos melhores amigas, nem confidentes fiéis, apesar de eu lembrar cada detalhe do dia em que me contaste que estava indo embora, e não era pra contar a ninguém- e não era pra chorar também- mas chorei.

Nunca nos adoramos loucamente. Mas poucas vezes alguém se foi da minha vida, alguém que ocupava um espaço grande, e deixei esse espaço aberto, pra que quando quisesse, voltasse e ocupasse novamente. Pra que quando quisesse, aparecesse. Sentasse na minha cama e ficasse tardes e pedaços de noite discutindo o presente, o passado e o futuro.

A gente aprendeu a dividir o espaço numa conversa. E acho que isso mostra um pouco da nossa aceitação. Te aceitei, fer- louca, inconstante, arrebatada pela vida e um pouco perdida entre tantos caminhos. Te aceitei, fer! Te aceitei apaixonada por uns, por certas coisas, e desencantada com tantas outras. Te aceitei sem definição, sem jeito certo pra descrição, sem palavra pra consolo, sem abraço apertado. Te aceitei- aceitei teu jeito- sem nem saber qual era!

Espero nos próximos anos, décadas... Te ver mais que essa Fernanda pra quem escrevo. Mas se quiseres- menos também. Acho que mereces os dois- a grandeza que a vida nos dá- e a criança em afeto que o tempo, quando aceito, nos torna.

Obrigada pelas conversas, pelo cinema, pela música, pela literatura, pela arte vista por olhos teus. Obrigada por me ceder um pouco desses olhos, um espaço no cantinho da tua cama, uns olhares, umas risadas, um espaço no cantinho da tua vida.

És o que há de mais verdadeiro nas minhas lembranças de anos atrás nessa casa que já te perdeu. Mas é, também, o que há de mais bonito nas minhas lembranças de hoje nessa casa que muito de ti guardou e sente falta. Que muito de ti guardou- e que hoje pede visitas, que hoje pede presença.

Faz a tua vida, fê! Faz dela um cinema- e me coloca num cantinho da tua criação- do teu criar diário- do teu inovar contínuo. Faz fê, vai lá, vai ser feliz!

Mil beijos,

Lé.

23/02/11



domingo, 20 de fevereiro de 2011

Padecer

Minha vontade de ser não fenece
Não fenece
Porque padece.
Padece, aguenta, atura, prova, suporta, tolera.
Não fenece
Porque padece,
Porque sofre.

Minha tentativa de ser não fenece.
Não fenece não.
Não fenece porque é angústia.
Não fenece porque é paixão.

Minhas tentativas não fenecem,
Não fenecem não.
Não fenecem porque são
Tudo que há
E a loucura de não passar em vão.

Minha tentativa de ser não fenece.
Minha vontade de ser não fenece.
Minha loucura não fenece.
E não fenecem
Porque padecem.

Não feneço
Porque padeço.
Porque aguento,
Porque sofro,
Porque provo.

E não feneço
Porque não me deixo fenecer.
E não feneço
Porque padeço,
Porque a vida faz padecer.

R.A 20/02/11

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

E os meus olhos ficam sorrindo...


"Sabe, para mim a vida é um punhado de lantejoulas e purpurina que o vento sopra. Daqui a pouco vai ser tudo passado mesmo - deixa o vento soprar, let it be, fique pelo menos com o gostinho de ter brilhado um pouco..." (Caio F)



E se eu pudesse dizer mais, não diria. Guardaria bem dentro, pra que um dia, talvez, olhasse de novo pra essa imagem e sentisse, além da saudade, a alegria, a felicidade, o amor que a minha alma sente. E se eu pudesse dizer mais... eu não diria. Não diria, pois não ousaria tornar de um tamanho qualquer o que é imenso. R.A 18/02/11

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Ao som de Chico my love!

Cada vez tenho largado mais o papel. Paro aqui, fico um tempo indeterminado olhando pra página em branco. Olho, só olho. Cada vez consigo menos tirar o vazio da folha. E por quê? cada vez, também, sinto mais. Cada vez amo mais, me encanto mais, choro mais. A vontade de vida tem sido tão grande que me parece não passar mais pelo espaço da criação. Será isso? Ando sabendo dizer tão pouco. A sede é tanta, é muita. Ando sentindo tudo pequeno demais- toda representação, mínima. Nada diz ao certo, nada tem passado a mensagem do subjetivo, do coração. Ando com algo enorme no peito, e nada sabe dizer isso. Choro ao contato com a vida que for. Choro pela perda do contato- minha, de outros- dos que já se foram há tempos. Choro com a música que escuto, com as palavras de gente- gente como eu, tu- que leio. E, ao mesmo tempo, sorrio por quase tudo isso também. Mas só- só sorrisos e só lagrimas. Só vontade de dizer. Sem palavras! Tenho me apaixonado todo minuto, todo segundo, todo suspirar. Pelo samba, pelo amor que já tinha, pelo novo que descobri, pelo velho já descoberto, pela vida, por mim. Tenho me apaixonado pelo que venho escutando, pelos sorrisos encontrados em meu rosto, pelos sorrisos que tenho encontrado em rostos por aí. E nada disso consigo dizer- falar da essência- do quanto me muda- me coloca na vida- me tira dela. Tenho amado mais do que vivido. Ou será que dizer "tenho vivido" já basta? Qualquer olhar me puxa, tantos abraços já me aquecem. As músicas de tanto tempo já me arrepiam. Os olhos de Chico- Chico my love- já se fazem os azuis que me tocam com a lembrança linda de uns caminhos percorridos pela cidade na companhia de uns que amo. Uns encantos meus, pelo que for, por tudo, já vêm na companhia de um carinho que tenho por alguém que traz na alma uma nobreza que não sei dá nome. Tudo- tudo tem me lembrado que tenho amado. Da luz do dia ao instante em que cansada fecho os olhos. Tudo! Tudo incluindo essa minha voz que cala. Esse coração que aperta e não sabe dizer. Esses olhos que fecham e se deixam ficar sem explicação. Tudo! Tudo tem me lembrado. Tudo- incluindo essa pouca existência de fim.
R.A 15/02/11

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

(Escrevi esse texto por coisas que tenho escutado, como desejos de expressão, de se mostrar, de se fazer. E, mais ainda, por aqueles que vêm me dizendo "gostaria de escrever assim". Espero que tenha conseguido passar a mensagem!)

Já tentei muitas vezes escrever romances. Mas tudo que consegui fazer até hoje, e muito pouco, foi reproduzir um bando de histórias que passaram pela minha vida e se misturaram, eu querendo ou não. Mas tudo que consegui fazer até hoje foi misturar as dores. Foi entrar em uns sonhos, cair em uns segredos, olhar nos olhos de olhos tristes. Foi tudo!
Erico lembrava que os escritores tem habilidades e debilidades. Acho que a habilidade, confesso, me falta. Mas a debilidade, talvez não.
Confesso, não sei transpor para o papel essa real- criada ou não- arte do encontro. Não sei fazer, porque não consigo abraçar a grandeza do encontro, a tristeza do desencontro. São grandes demais pra mim. E esta é a habilidade de um escritor, ainda mais de um romancista: o tamanho do abraço. Eles agarram a imaginação, caem, se jogam nela- e sabem, nos grandes casos- não se afundar rapidamente nisso. E, sim, irem se afundando aos poucos, conhecendo, explorando. E o meu abraço não tem esse tamanho sem fim. Eu tento, mas o impacto da criação é enorme pra mim. Aliás, o impacto da vida é. E criar é isso- viver uma história, mais uma e mais uma, infinitamente. E essa habilidade não tenho- essa capacidade de lidar com o que passa do que não se vê- não tenho. As poucas vezes que tentei- que criei- fui fundo- me machuquei. Foi uma tentativa disfarçada, até pra mim, de desvendar uma história que já existia. De talvez pegar a dor dessa história que já existia pra mim- tirar de quem sofria. E acho que aí vi, mais uma vez, uma das habilidades dos romancistas que não tenho: eles têm os ombros largos, um peito aberto e fechado ao mesmo tempo. Vivem a dor, mas a arte da dor- e não a dor em si. E eu- eu não sei fazer isso.
Tem um livro do Rubem Alves que se chama "Ostra feliz não faz pérola". Vi esse livro vindo da Pinheira, na estrada. Me encantei com o nome. Dizia assim- "Ostras felizes não fazem pérolas. Pessoas felizes não sentem a necessidade de criar. O ato criador, seja na ciência ou na arte, surge sempre de uma dor. Não é preciso que seja uma dor doída. Por vezes a dor aparece como aquela coceira que tem o nome de curiosidade." Achei lindíssima a definição.
E vindo pra Porto Alegre- pensando nisso- me veio a frase do Erico- aí que me veio. E aí descobri uma pelo menos daquelas possíveis debilidades de que falava: a dor. A dor sentida na essência dela e transformada no que for. E foi quando vi que mesmo sem as habilidades, tinha pelo menos uma das debilidades.
Nunca escrevi uma linha sequer sem um aperto no peito ou sem um nó na garganta; sem lágrimas nos olhos ou sem uma vontade de confessar-se; sem admiração, sem afeto, sem carinho, sem lamento- Nunca escrevi! Muito me senti quando li aquilo. Sorri! Como um raio de luz, de repente vi uma esperança de um mundo com gente que expresse- gente que precisa expressar, e expresse na criação. Que tranforme a dor em criação, em arte. E digo arte- qualquer arte. De repente vi um desejo imenso de criação de muitos por aí.
O que quero dizer é que vi em tantos de nós, muito daqueles que criam. A parte da debilidade. Aquela que faz com que o autor acabe no texto- que bota o sentimento- aquela que é a dor. Vi isso!
E nisso, um oportunidade imensurável de expressão- da gente- da gente que não sabe criar a perda, o ganho, mas sente forte ele, ela, aqui dentro. E expressão- uns quadros mal pintados no fundo de casa. E expressão- uma música composta e não lida por ninguém. Expressão- uns textos no fundo de uma gaveta.
Conheço uma pessoa que dizia escrever às gavetas. E falava com seriedade- sendo que escrevia e ainda escreve coisas dentre as mais bonitas que já li. Não sei o que dizer- mas se a beleza sabe viver dentro de uma gaveta, por que a dor não saberia?
E não só a gente merece se colocar no mundo- se reconhecer um pouco criador.... Como a própria dor, sozinha, também merece um espaço. E não precisa ser um espaço rodiado de habilidade, nem de olhos. Pode... pode sim ser um papel no fundo da gaveta, um arquivo perdido no computador, uns textos postados em um blog.
Não tenho a habilidade de quem cria, de quem imagina já com um lápis na mão. Mas tenho a esperança de quem imagina imaginando que imaginem também.
Acho a habilidade de quem escreve romances ou o que for, que encanta o mundo, algo que não sei dizer- acho sublime! Alimenta a minha alma.
Mas, mais do que isso... Acho as debilidades desses que encantam o mundo, tão sublimes quanto! Porque são as debilidades daqueles que simplesmente sentem. E o sentir- sentido de tantas e tantas maneiras- é simplesmente o "sentir".
O que digo com tudo isso, é que essa alma merece- merece muito- alívio. As debilidades exigem muito o alívio. E pra que haja alívio, não é preciso que haja habilidade alguma por trás. Não é preciso. Aliás... Tudo que é preciso é o impulso vital de se fazer, de se sentir. E, se necessário, uma gaveta pra guardá-lo depois ou uns olhos pra ler, como os meus...
R.A 17/02/11

sábado, 12 de fevereiro de 2011

As crianças são figuras interessantes. Observo meu irmão há duas horas. Há pouco tempo atrás ele catava sujeiras do tapete. Ficava felicíssimo quando encontrava alguma coisa. Daí ia até a cozinha, botava o pezinho no lixo e jogava ela lá dentro. Depois parou- achou interessante o que eu fazia com as mãos aqui. Quis tentar também. Abri uma página em branco pra ele e fui mostrando como era mágico isso aqui- fui mostrando a magia de escrever. Ele gostou! Ria, ria... E ficou aqui fazendo isso comigo até cansar. Acho que vou guardar esse arquivo cheio de letras e símbolos e números- do Ti. Acho que vou guardar esse sentir dele por muito tempo. A gente se vê bem pouco. Às vezes o tempo é longo entre um encontro e outro- e me dói ver que não me reconhece direito depois. Fica me olhando, demora horas pra se soltar. E às vezes nem dá tempo. Acho triste isso- porque eu sei, quanto mais o tempo passa, mais difícil fica. Quando a gente cresce, o tempo de se criar ocupa todo espaço. E quem tá junto- tá junto. Agora quem não tá, é difícil entrar. Quem não tá não vê os medos, os desejos, as angústias. Quem não tá mal vê os gostos. Agora quando a gente é criança- o espaço pra outros ainda é grande- o sorriso pra outros ainda é gigante. A gente chora na frente de outros, a gente grita, diz que não, que não gosta. Quando a gente cresce, tão pouco. Não tem outros! E eu- eu sou um dos outros na vida dele. Ainda vejo aquele rostinho de perto- aquelas vontades- aqueles medos. O tempo vai passar- e não mais. Ele cansou e foi arrumar a cama pra dormir- pegou o travesseirinho, a coberta- e deitou. Ficou lá quietinho- de olhos bem abertos- esperando minha mãe chegar. Ela chegou. Daí ele levantou de novo- veio pra cá- sentou no tapete. Levantou de novo, voltou, e isso muitas e muitas vezes. Foi pra cama- e me chamou: Richeiiiiiiiiiiiii! Richelli- ele me chama de Richelli. E eu gritei: Oi, Ti! E ele disse: vem me procurááá! Tô indo lá- afinal, daqui uns dias, vou procurar a criança, e não vou achar- ele já vai crescer. Já vai. Todos já vão.
R.A 11/02/11

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Agora- agora sei lá. É que essa coisa de querer ficar buscando sentido em tudo dá um cansaço na gente. Mas não falo da nossa busca- falo da busca dos outros. Da loucura de outros de achar que podem achar loucura no que é loucura: na gente. E falo dessa loucura que a gente é no sentido amplo da coisa- loucura como aquilo que a gente não sabe dá nome. Afinal, loucura é isso- aquilo que foge do que a gente sabe que é. E o que é a gente se não isso? Se não um bando de coisas que se diferem. O que é a gente? Tô numa confusão absurda. Me aceitei- e decidiram me negar. Não tão bruto assim- mas assim. Acordei num belo dia e me disseram que não- que aquilo que eu tava chamando de aceitação não tinha esse nome. Podia ter outro, tudo bem- mas não esse. Baixei a cabeça, chorei um pouco, e saí dizendo "não esse... não esse...". Ok, entendi- não esse! E entendi que não esse, porque existe outro- outra coisa pra aceitar- com um nome mais bonito. Ok, entendi de novo. O que eu não entendi é onde entra a parte que me conforta nisso tudo. A parte da vontade. Cresci com uma semi-perfeição incrível: fui a criança que falava com todo mundo, que sorria pra todo mundo, que saía com todo mundo. Depois cresci mais um pouco e fui a melhor da série até sei lá quando. E depois mais um pouco- e fui a guria que lia o que ninguém lia, que falava o que ninguém falava, que sorria quando ninguém esperava isso. Digo isso pra dizer "e agora?". Crescer assim não é fácil não- ainda mais quando não se tem por inteiro o que vem depois que a única ligação em carne que se teve um dia se rompe. Isso tudo pra dizer "e agora?". É que essa sou eu- essa aí que disse- sou eu. E esse eu aí gosta do nome mais bonito. Gosta das coisas mais bonitas que os olhos veem. E eu- eu não posso passar por cima de mim- desse lado rígido meu, que busca um espaço, que precisa de um espaço. Eu choro toda vez que me olho e me pergunto- "pra onde tô indo?"- Eu não sei. Tô tão dividida. E não adianta- penso, penso, penso... E aquela dorzinha chata continua ali. Agora entendo tanta coisa- agora entendo minha prima que sai se jogando por aí. Agora entendo o Caio- que nunca sabia o que fazer. É que a gente é muita coisa- muita, muita, muita. E a gente tem que encarar essa vida louca com UM corpo só. A gente tem que estar num lugar só, com um foco só. O problema é que a gente não é só. O problema é que eu não sou só. Eu me olho e não me vejo mais só aquela guriazinha com tudo pra se dá bem na vida. Não sou mais só essa- tenho outro lado. E sou louca por esse outro lado. E agora tô tendo que deixar ele dentro de mim- guardado aqui- no sorriso- numas palavras- em uns gestos. E tenho sofrido com isso. Confesso: eu tenho sofrido. Não deixei de ser feliz- ando cada vez mais feliz. Adoro a vida. E acho que isso que tem me confortado- não vou mentir. Não vou mentir- não sei o que faço. Mas não o que faço no sentido da ação- no sentido de sair num caminho. Não nesse! Eu não sei o que faço é com essa briga aqui dentro de mim. Acredito que a gente precisa de um pouco de turbulência, nem que seja pra sentir que não tá sentindo nada. No meu caso- agora- pra sentir que tô sentindo muito. Mas... o que fazer com esse muito? O que fazer?
R.A 11/02/11

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011


Sinceramente? não sei mais como falar de tudo, de mim. Não que não tenha mais o que falar- tenho, tenho sim, e muito. Aliás, nunca tive tanto. O que não sei mais exatamente é o que deixar aqui de tudo isso, como me colocar num texto, como falar da vida... Isso que não sei mais: como falar disso tudo, onde me colocar nisso tudo. Ando criando muito- mas as criações andam muito mais no contorno do outro do que no meu próprio contorno.Viver muito expande a criação. E daí a gente fica com tanto... e no fim, não sai nada. Não sai nada, porque a vontade de mostrar muito é gigante... Porque a vontade de mostrar o imenso é imensa... E o imenso não tem espaço no espaço- ele é imenso- e o imenso está em muito. No que a gente vê- e no que a gente não vê. E tenho passado por isso. Tenho me calado muito quando chega a hora de dizer o que me encantou- de mostrar que o que for é encantador- de descrever, de dizer como é. Tenho me calado quando chego aqui e tento dizer o quanto tenho estado bem, o quanto a vida tem me encantado, o quanto sei lá quem me fez feliz hoje. Tenho travado- e a culpa nem é de ninguém. Freud lembrava que a gente nunca consegue transmitir o que sabe de melhor. Acho que acabei batendo de frente com isso- e descobri que é verdade. Que eu não sou diferente, que eu também não consigo transmitir. Mas penso mais- acho que é verdade por uma coisa gigantesca. Acho que a gente não consegue, porque a gente não pode. Porque o que a gente sabe de melhor a gente descobriu dentro da gente. Tem que vir de dentro, bem dentro. E bem de dentro de cada um. E depois que a gente descobre... a gente descobre mais: a gente descobre que só quem já descobriu vê que já descobrimos- e tudo que a gente pode fazer é tentar ajudar quem não descobriu- e tudo que a gente pode fazer é ficar feliz vendo uns ou outros descobrirem. Que tudo que a gente pode fazer é volta e meia dar a mão, ajudar em uns tombos. Que tudo que a gente pode fazer é carregar uma esperança. No meu caso- uma esperança enorme. Uma esperança de ver o outro sorrindo tão quanto. É, no fim, é isso que a gente descobre. Que não adianta sair gritando por aí que a vida linda. Que não adianta, porque ninguém descobre isso lendo os meus textos, ou os textos de quem for. Que não adianta, porque ninguém descobre isso olhando pro céu, pra mim ou pra ti- e, sim, pra si.
R.A 09/02/11

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Feliz aniversário, Olavo!

Gostaria de te escrever em versos, como bem um dia tu fizeste, mas me faltaria rima, ou uma falta de rima que coubesse numa estrofe. Então só me restam as linhas... que perto do que tenho pra dizer, se tornam poucas. Gostaria de- acima dos versos- poder mostrar aqui um pouco da grandeza que abrigas e que descobri- mas, confesso, me sinto intimidada. É que és repleto de simplicidade, Olavo. E, sei, a simplicidade parece não intimidar. Mas intimida. É bonita demais pra ser dita. Poucos sabem dizer. Poucos são assim como tu. E, diante disso... pouco me sobra a dizer em palavras. Pouco me sobra, além de lembranças que adoro lembrar. Pouco me sobra, já que o mais bonito, pouco consigo expressar. Gostaria de te dizer muito, de falar desse brilho que tens nos olhos, desse encanto que dá às palavras, desse carinho que colocas no abraço. Mas não sei dizer. É mais forte que eu. E nunca entendi por que pouco falavam em ti como o Olavo dos versos, da música, do amor. Agora entendo: porque é difícil. Vejo isso aqui, na minha tentativa de mostrar a quem lê por que te escrevo. Procuro uma explicação... Mas talvez a melhor esteja em próprios versos teus:

"Tu que vieste ontem,
Assim sem aviso,
Agora é ternura
Pedindo acalanto.

Me fala um segredo,
Me conta uma história,
Que eu finjo que esqueço
Pra ninguém saber,
Mas acho um cantinho
Na minha memória
Pro sempre do sempre
Do meu bem-querer."

Vou levar isso para o resto da minha vida, Olavo. E ela, do tamanho que for. Como vou levar lembranças de nós cinco rindo, escutando uma boa música, jogando cartas até tarde da noite, caminhando cedo na Pinheira. Como vou levar a parte de mim que gosta do instrumento, das melodias, das cordas de um violão. Te agradeço eternamente pelo que ajudaste e vem ajudando a construir de mim. Acho que nesses dezesseis anos, não fechei uma mão com pessoas como tu. Espero nos próximos dezesseis, fechar essa e mais uma, duas se possível... Mas com a eterna lembrança de que ajudaste a abrir essa contagem, esses lindos encontros da vida. Como já te disse- Sei que "a vida é arte do encontro", mas tem encontros, confesso, que acho que nem a própria arte da vida explica por completo- Talvez sejam raros, não sei... Mas já posso dizer que existem. E que acho lindo.
Olavo, do fundo do meu coração- que vivas muito ainda, que continue a encantar, a ajudar a construir. Que continue a se deixar construir. Do fundo do meu coração- te desejo amigos, sorrisos, Denises, Clarissas, Bibianas, futebol, composições belíssimas, versos para eu chorar, Pinheiras pra se encantar... E, se quiseres, algumas argentinas, moças do tempo, Flávias Alessandras.... Mas, mais do que tudo isso, do fundo do meu coração, o que te desejo é VIDA... Pois sei que tu te encarregarás de fazer dela repleta disso tudo que falei e mais. Pois sei... sei porque és lindo, Olavo! De quem te admira profundamente- FELIZ ANIVERSÁRIO!

R.A 07/02/11

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Textos que não foram concluídos- lembranças que não tiveram um fim

"(...) É, realmente não teria presente algum pra esse natal. Até que ontem à noite me chamaram na sala. Estavam todos lá. Uns rindo sei lá de que, outros atentos à televisão, outros simplesmente alheios. Foi quando parei. Foi quando parei e vi aquele bando de vidas tão próximas a mim e que pouco conheço e que a cada dia que passa reconheço menos. Dei uma pausa, senti um aperto no peito. Olha, fazia tempo que não vinha tão forte. Fincou mesmo! Então respirei fundo, mais uma vez... Pensei em todas as vezes em que terei ainda que fazer isso, e em outras que já não farei mais... Nas vezes, quando pequena, que chegava correndo e caía nos braços de alguém. E em outras tantas, que queria ter chego, e não havia braços abertos. E fiquei ali parada. Fazemos pouco essas coisas. Talvez só na semana do natal mesmo. Talvez em algumas noites perdidas durante o ano... Mas só. Ninguém se olha muito aqui, é difícil. Pra uns, doloroso. Pra outros, um desperdício de tempo. Para poucos, talvez, uma eterna tentativa. E pra mim: quase que tudo ao mesmo tempo. Mas acho que tirando a parte do desperdício e colocando um fator externo que se chama "o mundo". Fugi de casa, ninguém viu. Tenho outras casas, tenho um mundo lá fora que me acolheu. Isso me afastou demais, não há dúvida. Mas não tive outra escolha, não me deram muitas alternativas. Se dividir em dois e ficar sofrendo pela metade não cabe. Ou fico inteira e bato de frente ou nada feito. Foi nada feito! E ontem à noite senti o peso desse "nada". Todos sentem. E foi quando vi que terei, sim, por muito tempo um pedido de natal... (...)"
(trecho 3) R.A/ 2010

II

Pensei que tivesse sido sonho. E não foi? Olha, gostaria que tu me respondesse. Tu anda tão calada ultimamente, não sei o quê que faço pra te fazer falar. Viu bem? Estou falando contigo mesma, a única pessoa nessa sala agora. Não finge que não está escutando. Sei que estás, afinal estou falando alto, impossível tu não estar escutando, nem tem ninguém no corredor. Talvez não tenha ninguém nesse andar inteiro. Estou gritando, ouviu bem? Grito: responda-me! Ok, vou parar! Parei, não falo mais. Não te imploro mais nada. Estava implorando, sim! É que realmente queria tua resposta, tuas repostas. É que ando sozinha, não sinto nada há dias, e realmente precisava sentir alguma coisa. E não preciso te dizer que não ando sentindo nada. Não ando sentindo nada fora, então queria pelo menos sentir algo dentro. Não precisa chorar. Tá, fica calma, não estou te colocando pressão, só estava implorando, é diferente. Sei como estás. Sei como se sente. Sei o que não sente. Sei o que pensas. Sei o que queres... Sei o que imploras mais e mais. E sei do que sentes falta dia após dia. Afinal, tu és eu, e eu sou tu.
R.A/ TRECHO DO LIVRO

CONTO

Sei o que deves estar pensando. Sei que deve tá achando tudo isso um egoísmo imenso meu, e toda aquela coisa que a gente tende a achar sempre. Ok, não tem problema. Não tem problema tu achares o que parece, não mesmo! Só que preciso te dar explicações maiores a respeito disso tudo, dizer o que penso, de verdade. Preciso te dizer que acho que não é bem assim, não é nada tão feio quando parece. Aliás, vejo até um lado contrário disso tudo: é quase bonito pra mim e pra ti. Mas tá, óbvio que não vou parar aqui pra te convencer de que o que tu achas feio é talvez bonito. Aí sim seria pretensão, egoísmo. Aí sim não estaria olhando pra ti. Mas não, não vou fazer isso. Só quero mesmo é te deixar ciente de que sei o que pensas sobre tudo isso, sei que não tá fácil, que tu deves pensar que eu devo ter encontrado um outro alguém. Ok, ok. Mas não! Não é bem assim. Tá, não vou te mentir, dizer que não encontrei nada. Encontrei, encontrei sim. Mas não é bem um outro, assim desse jeito: "outro". Até te falaria dele, desse "outro alguém", que não é bem “outro”, se eu não tivesse um medo de te causar um ciúme desnecessário, e falar de algo que ainda não conheço tão bem assim. Deves estar me achando louca agora. Deves até ter olhado a assinatura de novo no fim da página pra ver se lia algo meu mesmo. Sim, sei que fez isso! E também não tem problema! Imagina eu falando essas coisas. Nossa, até ri agora. Senti uma nostalgia imensa. E tu, tu deves estar pensando o que aconteceu comigo, mais do que pensavas a dias atrás, quando ficava imaginando coisas do tipo o meu encanto por outro alguém que não tu. Olha, te peço desculpas por tudo isso, por toda essa confusão. E não falo isso pra amenizar nada, ou pra fugir do assunto "o que aconteceu?". Faço isso, te peço desculpas, porque sei que devo. Não gostaria mesmo que fosse assim. Que eu tivesse que arrumar as coisas, sair um pouco, e deixar essa carta. E também não digo isso dessa forma porque pretendo voltar, ou acredito que tu vais me esperar. Não, não disse "um pouco" por isso. Disse um pouco porque estou indo, mas fico um pouco também. Não tô te largando inteiramente, viu bem? Tu, sim, podes me largar. Não gostaria! Acharia extremamente triste (assim, triste mesmo), doloroso. Mas também não quero te pedir algo impossível e te prender a algo que tu sequer compreende, ou que eu sequer compreenda inteiramente. Não vou te pedir isso nunca! Não vou te pedir espera, e não quero um pedido desses também. Aliás, tô deixando o telefone aí. Realmente não quero um pedido de espera! E engraçado: comecei isso tão acalma, e agora, agora que tenho que acabar, tenho que ir pro aeroporto (exatamente, é pra pensares que vou pra longe), sinto-me um pouco nervosa, desconfortável, com um certo medo. Mas, tenho que ir! E sei, não te expliquei até agora porque vou. Queres mesmo? E será que posso? É que soa tão, tão mal. Só que juro, vai ficar tudo bem. É pra ser bonito: mais pra ti e mais pra mim. Não te deixaria por algo menor, menos do que isso. Não te deixaria por algo sem beleza alguma, pode acreditar. Claro, sabes que nunca te diria algo do tipo "nunca te deixarei por ninguém". E, claro ainda, não te diria isto agora, quando te deixo. Mas pode acreditar, não te deixo mesmo por outro alguém. Não chega a ser um outro. Sou eu. Isso mesmo! Não tem ninguém nessa história além de mim e de ti. Somos só nós dois, como sempre foi. E, como quase sempre também, não é nada contigo. Aliás, te agradeço por isso. Por ter sido completo, e aceitado que eu não fosse. E te peço desculpas agora por não continuar apenas com a tua aceitação, e ter que buscar a minha, sozinha. Desculpa mesmo, mas sei que preciso ser mais livre, ser menos acolhida pra descobrir até onde chego, até onde posso. Desculpa, eu só quero sentir um pouco mais que o teu carinho. Quero sentir o meu por mim também! Desculpa!
R.A/ 2010

I

Sempre escrevi. Minha memória é a escrita. Tenho tudo guardado em palavras. Tenho gestos, dores, perdas. Tenho alegria, tenho encanto, tenho amor. Por isso nunca tive medo de acordar e não me lembrar de nada. Por isso nunca tive medo de me perder de uma hora pra hora. Sempre foi só resgatar papéis, cartas, textos, e me sentir de novo. Nunca tive um medo de chegar a certa idade sem infância, sem lembranças. Nunca tive medo de sair perdendo partes por aí. Sempre fui segura, sempre fui inteira de mim. E sempre fui, porque sempre escrevi. Porque durante todos esses anos, vim deixando parte de mim aqui. Vim deixando a mim, vim deixando a eles. Sempre escrevi, sempre me encontrei nas horas em que cansada, me perdia. Sempre escrevi, sempre pude largar o que estava pesado demais, mas que não queria que se perdesse totalmente. Sempre foi assim, sempre seria. Sempre pensei que teria isso que já não chamava mais de "escrita", e sim de "apoio". Sempre pensei que, como uma recompensa da vida, poderia fugir para o papel, me esconder em palavras. Sempre pensei que, como em uma prova onde vale tudo, valeria nessa vida pra mim um pouco de refúgio. Sempre escrevi, sempre pensei que escreveria. Mas fui enganada.
R.A/ TRECHO DO LIVRO

Textos que não foram concluídos- lembranças que não tiveram um fim

"Não gosto muito de falar de pessoas específicas aqui, dar nomes, citar situações das quais vivi e das quais presencio. Não gosto muito porque acho lindo ter a chance de despertar a critividade de cada um, e deixar o outro adaptar o que digo, o que penso, da maneira que bem entende, da maneira que o deixaram poder entender, simplesmente assim. Gosto de deixar o outro me criar um pouco da maneira que quer, e se criar um pouco também dentro da própria criação. Acho belíssimo, poético, encantador tudo isso. Mas acho, também, que hoje vou abrir uma exceção. Adoraria poder abrir uma exceção todo dia, a cada momento em que aquele alguém, qualquer alguém, me encanta mais e mais. Mas, por aquilo que disse, prefiro não fazer. Mas hoje vou abrir essa exceção. Vou abrir porque nos últimos dias tenho presenciado coisas lindas, como uma adoração pelo que há, e pelo que vem a ser. Vou abrir essa exceção porque acho que devo (sim, sinto-me na obrigação) de mostrar o quão lindo somos, e o quão lindo podemos ser nos dando um espaço maior pra viver, um espaço maior pra ser, simplesmente. A história é mais ou menos o que vou contar agora, não tão curta quando a farei, e não tão simples quando a deixarei... mas, na essência, é ela: tenho uma amiga. (...) Talvez hoje ela não entenda o exato porquê pelo qual escrevo. Talvez ela ache isso tudo simplesmente algo inovador, inesperado. Talvez tudo que ela pense seja o quão rápido o tempo passa, e o quão mais rápido ainda nos transformamos nesse curto espaço de tempo; sim, talvez seja bem assim; só que a beleza em si não está nisso, nessa visão dela de certas coisas, e sim no quanto cresceu até chegar aí, e quanto tende a crescer nos próximos dias, meses, anos... A questão é a beleza desse crescimento e a força que ela teve pra construir toda essa beleza que tanto me encanta."
(Trecho 2) R.A/ 2010

Textos que não foram concluídos- lembranças que não tiveram um fim

"Acordei diferente hoje. Sempre dou um pulo, saio rindo. Sério, é assim mesmo. Sempre assim, todos os dias do ano. Chuva, sol, morrendo de frio. Basta eu abrir os olhos, que me aparece um sorriso no rosto. Lembro que minha mãe falava isso quando era pequena: que era a única que ela conhecia que acordava rindo. Falou isso por anos, é uma das minhas lembranças mais fortes. E quando parou de dizer, comecei eu a fazer por ela. Comecei a me olhar, a dizer quem sou. E me encontrei assim, do jeito que ela dizia: sorridente ao amanhecer. Só que hoje acordei diferente. Pode ser porque foi mais tarde, e reconheci uma troca de rotina, ou uma perda, que não esperava com muita empolgação. É, pode ser. Pode ter sido uma certa manifestação de revolta por parte minha. Foi como dizer que este não era mais um de todos os outros para encarar e viver. E não sei porque aconteceu assim. Porque era, sim, mais um dia parar encarar, sabia disso, sabia muito bem. Mas não o fiz. Fiquei na cama, e chorei ao abrir os olhos."
(Trecho 1) R.A/ 2010
Já não sei mais. Já não sei o que dói mais, o que pesa mais, e o que me faz escrever agora. Se é o outro lado, ou se é esse meu lado que anda lutando pra ficar mais só. Já não sei identificar, dividir, separar o que é meu do que é teu. Tenho estado dois ultimamente. Tenho sido o que encontro em ti e o que ando descobrindo de mim. Abandonei um lado meu, abri espaço pro que parece ser teu. Fugi de uma dor, encontrei outra. Fugi da minha dor, encontrei a tua. A tua dor, que é grande. E já não sei mais até que ponto tenho sofrido por algo que existe, já que essa existência não reside na minha própria existência, e sim na tua. Não sei até que ponto tem doído por uma dor verdadeira, ou, simplesmente, pela delicadeza, talvez, de tentar sentir a dor. Me joguei na tua história e ando perdida. Te abracei, não soltei, fiquei um pouco de ti. E agora um lado meu tá doente, tá meio sem movimento. Fica parado, quieto, sofrendo uma dor que volta e meia já se pega acreditando que é sua. Tenho uma parte doente aqui, que anda me invadindo. Ando tendo umas fincadas no peito, umas lágrimas no rosto... Ando com necessidades imensas de distração, porque já é cotidiano cair na tua história. Queria voltar atrás, fechar os olhos naquele minuto e fingir não estar te vendo sentir aquilo. Queria não ter visto o teu olhar de “teria sido tudo tão diferente”. Queria não ter encontrado a parte de ti que morreu e ninguém enterrou. Que anda quieta na tua face, num abraço teu, numa palavra qualquer... Mas, ao mesmo tempo, não queria "não ter" o lado teu por completo. Queria só a parte da dor fora disso. Entende? É que te amo. Te infiltrei na minha história, tentei colocar sorriso nesse rosto. Consegui. Só que não só o sorriso veio, não só. E agora tenho estado meio perdida.
R.A/ 2010